Morador de hospital há 49 anos diz que seleção precisa de heróis

Morador do Hospital das Clínicas, em São Paulo, desde 1969, Paulo Henrique Machado, 50, costuma assistir às Copas do Mundo na companhia de amigos. Depois do surgimento das redes sociais, os amigos reais se somaram aos virtuais, alcançando até Neymar.

Paulo chegou a gravar um vídeo convidando o jogador a uma visita à “sua casa”. O atacante não pôde comparecer, mas enviou de presente uma camisa da seleção brasileira autografada.

“Assim como ocorria com Ayrton Senna, o Brasil precisa de heróis. E Neymar é um grande herói para o país”, afirma.

Apesar da empatia que tem com o jogador, Paulo ressalta que nenhuma Copa se compara a de 1982, primeira da qual tem lembrança. “Havia uma paixão muito grande pelo futebol da parte de jogadores como Zico, Sócrates e Casagrande. Hoje você não vê isso”, diz.

“Mas não é nem culpa deles. Existe muita cobrança das empresas que pagam os jogadores. Virou algo comercial”, completa.
Paulo não acredita que o Brasil vai ser campão da Copa da Rússia. Mas caso seja, desta vez, ele poderá comemorar plenamente.

Quando o país foi tetracampeão em 1994, a morte de uma amiga com quem dividia o quarto impediu de sentir alegria.

 

“Restamos apenas nós dois”, diz ele, referindo-se à Eliana Zagui, 44, com quem compartilha o quarto há mais de 40 anos. Desde que chegaram, eram sete pacientes – sete crianças. Hoje, Paulo e Eliana são os únicos moradores do Hospital das Clínicas. Ambos foram vítimas de poliomielite.

“Ela é praticamente uma irmã para mim”, diz ele. Eliana é autora de “Pulmão de Aço – uma vida no maior hospital do Brasil” (Belaletra Editora, 2012).

Mas quem realmente gosta de Copa é ele. “É muito divertido”, ressalta. Além do Brasil, Paulo gosta de assistir a todos os outros jogos da Copa, aparentemente indo contra a corrente. Em Alemanha x Coreia do Sul, torceu para a Coreia; entre Argentina x Nigéria, apostou na Argentina. “Gosto da arte coreana, por exemplo”, brinca. Também torce pela Bélgica, país natal de um grande amigo.

Entre os jogos da Copa, Paulo retoma suas atividades. Está estudando projetos relacionados à educação e à acessibilidade para se candidatar a deputado estadual – “estou entrando de cabeça” – e se dedicando, como sempre, aos jogos de videogame que transmite ao vivo. “Sou gamer”, afirma.

A mãe de Paulo morreu dois dias após seu nascimento. Com um ano e meio de idade, teve paralisia infantil. Foi encaminhado para o Hospital das Clínicas sem movimento nas pernas. Ao longo do tempo, a paralisia atingiu seu sistema respiratório e desde então, usa aparelho de respiração artificial.

No hospital, aprendeu a ler e a escrever. Concluiu o ensino médio e formou-se em diversos cursos na área de tecnologia.